Qual a paz que almejamos? O Rio, a Chaleira ou o Pássaro?
Por Marcos L Susskind
O Rio, a Chaleira e o Pássaro é o título de um livro maravilhoso que trata das diferentes formas de paz possíveis (Editora Colel, 1984). Escrito para ser lido por homens que queiram uma vida em família com poucos conflitos e muita consideração mútua, é obra de Aharon Feldman. O livro foi minha inspiração para este artigo que trata da paz entre as nações que começa a se desenhar no Oriente Médio.
Em 15/09/2020, no gramado da Casa Branca, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein deram importante passo para o fim do conflito no Oriente Médio. Aparentemente o Catar, Sudão, Omã, Marrocos e Arábia Saudita estão à espera de seguir os mesmo passos. Os Emirados nestes poucos dias já assinaram acordos de cooperação entre institutos de pesquisa, decidiram por um festival de cinema conjunto, abriram os céus para voos diretos, assinaram cooperação em pesquisas médicas, contrataram um jogador Israelense para seu principal time de futebol e outros passos importantes. Antes deles, Egito, Jordânia e Israel já haviam assinado acordos de paz, em 1979 e em 1994 – aparentemente formas diferentes de paz.
A primeira forma de paz, segundo Feldman, é a paz simbolizada pelo rio, a ausência de conflito. Os grupos não entram em conflito porém vivem suas realidades separados, os contatos entre eles se dão exclusivamente para satisfazer suas necessidades ou seus interesses. O rio que os liga leva e traz o que cada um precisa sem interferir, ajudar ou interceder em suas vidas.
Há um nível mais elevado de paz, onde dois grupos se unem para fazer algo que nenhum dos dois conseguiria sozinho. Construir um edifício, construir um avião ou lançar um satélite exige cooperação e comunicação entre pessoas, empresas e até países. Esta é uma paz dinâmica, a cooperação é fundamental para se chegar ao sucesso. Imagine alimentos que precisem ser cozidos. Se você leva os grãos ao fogo, eles queimam e se você os emerge em água, eles encharcam. No entanto se você usa uma chaleira (ou panela), ela fará com que o fogo de um lado e a água com o alimento de outro mudem a natureza dos insumos, transformem o duro arroz ou feijão em algo saboroso e macio. A chaleira viabiliza que o fogo e a água, tão diferentes entre si, se unam para um bem. Ela representa o segundo nível de paz.
Mas há um terceiro nível, o mais elevado de todos, representado pelo pássaro. Este pode voar nos céus ou andar no solo. Ele funde dois tipos de vida bem distintos. Não são entidades separadas, é o mesmo pássaro que uniu características de dois tipos diferentes. Cidades diferentes têm populações distintas, podem ter climas diferentes, prefeitos com visões distintas, mas formam parte de um mesmo país, um mesmo destino.
Em minha opinião, a paz existente entre Egito, Jordânia e Israel é a paz do rio. Não há conflitos, há cooperação na questão de água e agricultura com a Jordânia, e em gás, segurança e agricultura com o Egito. Cada nação segue sua vida sem conflitos e com poucos contatos. Já a paz que se delineia com os Emirados e com Bahrein dá mostras de ser do tipo chaleira. Decorrido apenas uma semana já se assinaram acordos de cooperação entre os maiores bancos de Israel e dos Emirados – Bank Hapoalim e Bank of Dubai. A Universidade Bin Zayed e o Instituto Weizmann já assinaram protocolos de cooperação científica, a Israir e a Emirates já conversam sobre turismo conjunto e até o noticiário noturno em Dubai, Bahrein e Israel foi aberto conjuntamente em 16/09!
O terceiro nível, a paz significada pelo pássaro, em que os atributos de ambos se fundem, me parece não ser algo possível entre nações já que nenhuma nação abdicará de sua cultura, suas fronteiras ou seus interesses para unir-se a outra. Já tivemos tentativas aqui no Oriente Médio: Egito e Síria formaram a República Árabe Unida que durou apenas três anos. Em 1958 nova tentativa, Federação Árabe entre Jordânia e Iraque, durou menos de seis meses. Também na Europa e na África estas uniões não deram certo: – República Tchecoslováquia se separou em República Checa e Eslováquia, Iugoslávia, União Soviética se dissolveram – muitas vezes inclusive com guerras como Kosovo, Bósnia e Sérvia ou Índia e Paquistão.
A paz que se desenha entre Israel e seus novos amigos provavelmente será a paz da chaleira. Sem dúvida, caso isto ocorra, ambas as nações verão grandes progressos e o mundo, seguramente, será mais seguro e mais criativo. As primeiras indicações são positivas, extremamente positivas.
Foto: Flickr
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Excelente artigo, Marcos.
No passado, o jornalista Ehud Yaari disse que entre Israel e o Egito não há uma paz fria e sim, uma guerra fria onde o Egito age contra nós em todos os fôros internacionais, nos condenando em tudo.
Creio que já não são tão radicais, mas a paz realmente naoo penetrou no coração da população, extremamente canto Israel, mesmo depois de 25 anos de “paz”.