O novo Irã com o Açougueiro de Teerã
Por Deborah Srour Politis
Na última sexta feira, uma barragem de 20 mísseis caiu no norte de Israel. Esta barragem veio dois dias depois de três mísseis terem sido lançados do Líbano sobre Kyriat Shemona. A diferença é que os mísseis da quarta-feira teriam supostamente sido lançados por um grupo palestino fora da lei. Mas na sexta, a Hezbollah tomou a responsabilidade diretamente.
O interessante é que a Hezbollah enviou mísseis para campos abertos e ninguém foi ferido. A pergunta é, por que agora?
A primeira coisa que veio à mente é que o Irã tem um novo presidente. Na quinta-feira, Ebrahim Raisi, o Açougueiro de Teerã, assumiu o cargo, prometendo uma radicalização e uma beligerância ainda maior do Irã.
Como com a Coreia do Norte, que precisa mostrar seus músculos a cada mudança de líder, o Irã, através de seu filhote Hezbollah, está tentando mandar uma mensagem para Israel, que chegou um novo líder. Uma atitude muito adulta.
Se por um lado Raisi deu preferência a se encontrar com líderes de grupos terroristas logo depois de sua posse, como o Hamas e a Hezbollah, por outro, ele declarou em inglês que está disposto a negociar diplomaticamente a suspensão das sanções contra seu país.
Não há nada de novo sobre um líder do Irã falar pelos dois lados da boca, especialmente quando muda para o inglês. Mas houve uma razão para Raisi ter sido escolhido pelo Supremo Líder Ali Khamenei, para substitui-lo. E isso tem a ver com os milhares de protestos em todo o país contra a situação econômica e a ruina da infraestrutura pelo mau gerenciamento dos aiatolás.
É esperado que Raisi, “o Açougueiro”, para seguir a linha dos aiatolás, irá governar com punho de ferro, fechar as comunicações com o exterior, reprimir violentamente os protestos em todo o país e mentir sobre tudo para a comunidade internacional.
E não há dúvidas que ele continuará a tradição de culpar os Estados Unidos e Israel pelas terríveis dificuldades econômicas – a América pelas “sanções paralisantes” e Israel por agressão (seja lá o que isso for).
A diferença é que hoje o povo iraniano está tão farto de situação nas mãos deste regime que não acredita mais nesta propaganda. Eles querem comida no prato e água na torneira, ambos os quais estão tão em falta quanto a eletricidade. Uma vergonha! Um dos dez maiores produtores de petróleo e gás do mundo, ter que racionar eletricidade, água e comida.
O fato de que as manifestações contra o governo incluam slogans pedindo a morte de Khamenei significa que o povo não tem mais medo das penas de morte e tortura que recaem sobre os dissidentes iranianos. O povo está dizendo que não tem mais nada a perder e sai nas ruas para denunciar o financiamento da Hezbollah no Líbano, as milícias no Iraque, os Houthis no Iêmen, o terrorismo palestino do Hamas, sem falar do dinheiro gasto com mísseis balísticos e ogivas nucleares.
O problema é que o que eles têm a ganhar (a mudança de governo) pode ser facilmente frustrado pelas fantasias de Washington. Sim, o governo Biden incrivelmente se recusa a abandonar o desejo de retornar os Estados Unidos a alguma forma do Acordo Nuclear de 2015 como a única maneira de conter a ameaça de Teerã.
A idiotice e ingenuidade da ilusão da equipe Biden é tanta, que eles acreditam firmemente que um acordo com o regime liderado pelo açougueiro de Teerã (e numa outra oportunidade vamos falar do porquê do título tão elogiador) garantirá maior “transparência” de suas atividades nucleares e, portanto, uma melhor capacidade de mantê-lo sob controle. Raisi, sem dúvida, deve ter dado altas gargalhadas quando leu isso.
É como se esta administração americana tivesse resolvido esquecer o monstruoso arquivo que o Mossad retirou do Irã, e que deu provas concretas da violação do Acordo Nuclear por Teerã e prontificou Donald Trump a sair dele.
Raisi, também está ciente de que foi o conteúdo destes arquivos que levou à assinatura no ano passado dos Acordos Abraão entre Israel e os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein, e a aproximação com outros vizinhos árabes. Esses países não estavam apenas interessados em se alinhar com os durões do pedaço – Trump nos Estados Unidos e Benjamin Netanyahu em Israel. Seu maior interesse era e continua a ser, de impedir que o Irã obtenha armas nucleares armas e exporte sua revolução terrorista para seus países.
Raisi sabe que precisará exercer força bruta sobre um público furioso e flexionar seus músculos para o Ocidente mas apenas o suficiente para ser apaziguado e conseguir mais concessões.
E isso nos traz a Israel. Durante uma reunião em Jerusalém na quarta-feira com embaixadores de países membros do Conselho de Segurança da ONU, o ministro da Defesa israelense, Benny Gantz, afirmou inequivocamente que a Força Aérea do Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica estava por trás de “dezenas de ataques terroristas no Golfo Persico empregando drones e mísseis”, inclusive o último a um navio gerenciado por uma companhia israelense aonde o Irã matou um cidadão britânico e um da Romênia.
Yair Lapid, ministro das Relações Exteriores de Israel foi mais além dizendo que “este foi um crime internacional”, e perguntou “o que a comunidade internacional vai fazer a respeito? O direito internacional ainda existe? O mundo tem a capacidade e a vontade de aplicá-la? Se a resposta for sim, então o mundo precisa agir agora.” Caso contrário, “será cada um por si”.
O Irã conta com isso, e com razão – especialmente tendo em vista a decisão da União Europeia de enviar o diplomata Enrique Mora à cerimônia de posse de Raisi. E uma vez que Raisi anunciou que “certamente negociará para suspender as sanções”, a presença de Mora, mesmo tendo sido relegado a um banco de trás da cerimônia de posse, significa que a UE está tão ansiosa para voltar ao Acordo Nuclear como os Estados Unidos. E ataques letais de drones a navios comerciais para a UE são questões menores.
A imagem do representante europeu sentado atrás do Hamas e da Hezbollah mostra que a liderança iraniana quer reforçar a ilusão americana de que só um acordo que irá suspender as sanções poderá trazer o Irã para a mesa de negociações e a ilusão de que os aiatolás continuam firmes e fortes dentro de casa.
No dia 26 de julho, o Comandante da Guarda Revolucionária iraniana, Hossein Salami declarou que “todo o mundo muçulmano se tornou uma arena de jihad e os arrogantes [americanos] estão fugindo”. Ele disse que “o Líbano e a Hezbollah agora estão fortes e capazes contra os sionistas, e toda vez que o inimigo se mover, a Hezbollah o cortará pela raiz”. Salami continuou dizendo que os inimigos “devem saber que a nação iraniana não desistirá do Islã e da revolução por causa de cortes de energia ou falta de água … O povo do Irã tem mostrado nestes dias que é leal aos ideais do Islã e dos da revolução”.
Salami parecia não entender que as imagens das pessoas protestando contra o regime corrupto e repressivo conseguiram chegar ao Twitter e mostrar a discrepância entre suas palavras e o que se passava na rua de baixo. Mesmo assim ele disse algo que acredita ser verdade: que “hoje, o Irã está ditando os termos sobre os quais uma superpotência como a América retornará ao acordo nuclear, e isso indica a autoridade exercida pelo Irã islâmico”.
Biden e seus companheiros europeus não devem provar que esta corja está correta. Chegou a hora de tirar proveito das rachaduras na armadura deste regime.
Mas se conhecemos Biden, isso não vai acontecer num futuro próximo. E neste caso, Israel terá que agir sozinha. Esperemos que o primeiro-ministro Naftali Bennett e seu novo governo estejam à altura da tarefa e que a oposição se una a ele nesta empreitada.
Foto: Mostafameraji, CC BY-SA 4.0 (Wikimedia Commons)