Incêndios criminosos
Por Nelson Menda
Dos 260 incêndios florestais que estão ocorrendo no Estado do Oregon, no momento em que estou redigindo este texto, 99% foram provocados por seres humanos.
A Costa Oeste dos Estados Unidos, onde estão situados, de Norte a Sul, os Estados de Washington, Oregon e Califórnia costuma apresentar focos de incêndio nos meses mais quentes do ano, ou seja, durante o verão, que ocorre no Hemisfério Norte em um período oposto ao do Brasil. As autoridades desses três estados, apesar de realizar grandes campanhas educativas para reduzir os riscos das queimadas, precisam enfrentar os desavisados, irresponsáveis e até mesmo criminosos que tem provocado, ano após ano, a destruição de grandes áreas verdes.
No dia 4 de julho passado, data comemorativa da independência norte-americana, dois indivíduos foram flagrados soltando fogos de artifício artesanais da janela do veículo em que trafegavam por uma rodovia do Oregon, provocando incêndios na vegetação do acostamento. Suas gargalhadas e os estampidos dos fogos chamaram a atenção de outros motoristas, que conseguiram alertar as autoridades policiais. Os irresponsáveis foram presos e vão responder a processo por essa atitude criminosa.
Os incêndios florestais, que além da destruição da cobertura vegetal produzem vítimas entre seres humanos e animais, são classificados, aqui no Oregon, pela área atingida. Assim, uma queimada é considerada grande quando atinge 100 ou mais acres, o que corresponde a 0,4 Km². Os que chegam a 300 ou mais acres (1,2 Km²) exigem o envio de equipes especializadas para combatê-las. No presente momento, nada menos de 200.000 acres de matas nativas ou reflorestadas do Oregon estão sendo consumidos pelo fogo, neste que já é considerado o maior incêndio dos Estados Unidos.
No ano passado, durante a temporada de incêndios, que chegaram às cercanias de Portland, onde resido, o céu chegou a ficar avermelhado por várias semanas e o ar ficou irrespirável. Tivemos de sair às pressas, em plena madrugada, em direção à cidade costeira de Astória, pelo receio que as chamas chegassem até nossa casa. O que, felizmente, não chegou a acontecer, mas foi por pouco.
Além dessa nova e pouco agradável experiência, acabei travando conhecimento com a existência de um eletrodoméstico que, até então, desconhecia por completo: os purificadores de ar. Esses aparelhos, em questão de poucas horas, desapareceram das prateleiras das lojas especializadas. As partículas de fuligem permanecem em suspensão no ar atmosférico até que caia uma boa chuva e ele volte a ficar respirável. Por ironia do destino, no estado do Oregon, onde as precipitações atmosféricas são frequentes, as nuvens de chuva simplesmente não marcaram presença na pior fase das queimadas de 2020. Deu até vontade de apelar para um daqueles pajés que conseguem atrair a chuva com seus cânticos tribais. Depois de duas semanas de exílio forçado em Astória, quando retornamos a Portland foi possível vislumbrar, no trajeto de volta, o que restou dos troncos calcinados das árvores atingidas pelas chamas.
Esses grandes incêndios chegam a mobilizar, além dos bombeiros, legiões de voluntários e até mesmo de detentos das penitenciárias. A Governadora do Oregon, Kate Brown, acaba de conceder um indulto a 23 presos que ajudaram a combater os focos de incêndio no ano passado, reconhecimento mais do que merecido. Além de manter equipes e recursos especializados no combate ao fogo, com destaque para os aviões cisterna, existem mapas, disponíveis em tempo real pela internet, que exibem com precisão as regiões que estão ardendo, em que a evacuação é mandatória, além das que apresentam o risco potencial de também vir a ser atingidas.
Devo confessar que a primeira grande queimada a gente jamais esquece, pois a sensação de fragilidade face ao avanço das chamas é assustadora. Por bizarro que possa parecer, enquanto as sociedades evoluídas e progressistas tratam de prevenir e combater incêndios, grupos de terroristas e alucinados agem de maneira diametralmente oposta. Não estou me referindo aos piromaníacos, uma categoria de doidos que existe desde que o mundo é mundo, com destaque para o tresloucado imperador romano Nero, que incendiou Roma por puro prazer. Mas aos extremistas que utilizam balões incendiários para provocar, intencionalmente, incêndios, sem se dar conta de que as labaredas são impulsionadas pelos ventos e que o feitiço pode virar contra o feiticeiro a qualquer momento.
Grupos terroristas que tentam destruir o Estado de Israel vem utilizando, há tempos, balões incendiários para provocar danos às residências e lavouras irrigadas, com enorme sacrifício, em uma terra que já foi árida e hoje é um modelo de fertilidade e produtividade para todo o mundo. Se esquecem de que, basta o vento mudar, para que esses balões acabem caindo e calcinando seu próprio território. Se direcionassem seus esforços para uma atividade em prol do seu povo estariam prestando um belo serviço a eles próprios, mas é preciso que o próprio tempo se encarregue de abrir seus olhos.
Essa “ideia de jerico”, como se diz no Nordeste do Brasil, de utilizar balões incendiários como arma de guerra não é nova. Já foi utilizada pelo Japão em uma fase de total desespero, quando a derrota na Segunda Guerra se mostrava inexorável. Por coincidência, os ataques com balões incendiários provenientes do Japão ocorreram na mesmíssima região de Astória, litoral do Oregon, onde nos refugiamos da queimada do ano passado. Os militaristas japoneses tiveram a ideia de mandar confeccionar grandes balões incendiários dotados de explosivos, para que os ventos se encarregassem de fazer com que chegassem aos territórios da Costa do Pacífico dos Estados Unidos e Canadá. Tencionavam destruir, pelo fogo, grandes áreas florestais desses dois países e atingir regiões de produção agrícola e industrial. Chegaram a lançar 9.000 balões incendiários em 342 incidentes relatados pelas autoridades aliadas.
Todavia, o mais trágico desses episódios não atingiu nenhuma instalação militar estratégica, mas sim uma pacata família de pastores, constituída por um casal e seus cinco filhos, todos menores, que tinha resolvido passar um fim de semana no campo. As crianças avistaram um desses balões incendiários preso na ramagem de uma árvore. Julgando tratar-se de um inofensivo aparato meteorológico, começaram a puxá-lo, tendo detonado, inadvertidamente, sua carga explosiva. As cinco crianças tiveram morte instantânea e a mãe conseguiu sobreviver, mas à custa de graves ferimentos. Se os terroristas que ainda tentam se valer de balões incendiários para tentar destruir o Estado de Israel conhecessem um pouquinho de história e tomassem conhecimento da existência desses 9.000 artefatos japoneses que só conseguiram atingir uma inocente família norte-americana talvez parassem para meditar sobre a inconsequência de seus atos.
Quando meu conterrâneo Oswaldo Aranha, na Presidência da histórica Assembleia Geral da ONU de 29 de novembro de 1947, bateu o martelo para ratificar a aprovação, por ⅔ dos votos dos delegados, da partilha da então Palestina entre judeus e árabes, não poderia imaginar que, passados 74 anos ainda existiriam organizações dispostas a provocar, intencionalmente, incêndios criminosos. Quantos anos mais a humanidade terá de esperar para que o bom senso volte a imperar entre os povos?
Fonte: Bruhmoney77, CC BY-SA 4.0 (Wikimedia Commons). Salem, Oregon, setembro de 2020
Me pergunto quanto tempo mais Israel precisa para que os terroristas o deixe em paz!
É muito triste a constatação de que no curso da história uma grande parte da humanidade há se portado de forma irresponsável e perversa.
Estamos colhendo o que plantamos, conforme diz o velho ditado, e neste passo pagam também os justos….
Lamentavelmente acredito que o bom senso nunca imperou entre os povos…
Não estou certa de que em direção caminhamos mas estamos longe de sermos dignos de admiração!