A explosão e outra oportunidade para a Hezbollah
Por Deborah Srour Politis
Esta foi uma semana muito dura para o Líbano.
Desde o ano passado, a situação da Suíça do Oriente era de pré-falência quando os protestos populares começaram contra o governo. A dívida do país de 90 bilhões de dólares é 170% do produto interno bruto. A libra libanesa perdeu 80% do seu valor em menos de 10 meses, pulverizando as poupanças e num país que depende de importações para tudo, de suprimentos médicos, a alimentos e energia, não há mais dinheiro para comprar no exterior.
Um pedido de empréstimo ao Banco Mundial foi aparentemente negado porque os dirigentes libaneses se recusaram a efetuar reformas estruturais particularmente as que envolviam eliminar a corrupção. Em meados de março, como outros países do mundo, o Líbano foi obrigado a declarar o lock-down para deter o alastramento do Coronavírus no país. O fechamento de empresas e comércio piorou ainda mais a situação econômica do país. E aí na terça-feira veio o prego que lacrou o caixão: uma mega explosão no porto de Beirute que destruiu não só a linha vital do país, mas devastou completamente a cidade.
2.750 toneladas de nitrato de amônia pobremente armazenadas há seis anos tiveram o efeito de uma verdadeira bomba atômica sem o efeito radioativo. Portas e janelas de moradias situadas há mais de 10 km de distância literalmente explodiram. Nada menos que 300 mil pessoas ficaram desabrigadas em um minuto. Isto é mais que 10% da população da cidade. Até agora foram encontrados 158 corpos, mas ainda há dúzias de desaparecidos levando-nos a crer que o número de mortos deve subir.
As reservas nacionais de trigo e outros grãos estavam armazenadas no porto e foram completamente destruídas. Isto quer dizer que em poucas semanas não haverá mais pão no país. E tudo isso devido à incompetência, incapacidade e inércia da elite que governa o Líbano. Hoje o povo libanês só vê pobreza e desemprego em seu futuro.
Esta elite, altamente corrupta, que inclusive usava o porto para suas importações ilegais, foi mantida no poder por causa do sistema político do país que vai de acordo com suas afiliações religiosas e étnicas e não pela competência do indivíduo. A comunidade internacional fechou os olhos para a deterioração do país porque era cômodo ter um semblante de estabilidade depois da guerra civil. Hoje os libaneses dizem que até naquela época, com explosões e carros bomba diários, nunca havia faltado pão.
O Líbano era chamado de Suíça do Oriente porque além de abrigar mais de 18 denominações religiosas, sempre foi um país culturalmente avançado aonde além do árabe, o francês e o inglês são línguas reconhecidas e faladas normalmente. Isto era quando existia um equilíbrio entre as comunidades cristãs e a muçulmana sunita majoritária. Mas a criação da Hezbollah, um grupo reconhecidamente terrorista, mudou o equilíbrio político no meio da guerra civil levando a todos os confrontos com Israel.
A Hezbollah nunca deixa de se aproveitar de uma boa crise. Para o grupo, que ocupa o sul e o centro do Líbano e mantêm um arsenal de 150 mil mísseis apontados para Israel, a explosão pode ser uma bênção. Ela irá capitalizar na destruição dos bairros mais liberais de Beirute ao cravar suas garras nos esforços de reconstrução.
Já vimos este filme antes. Depois do assassinato de Rafik Hariri em 2005, que muitos atribuem à Hezbollah, o grupo se manteve quieto enquanto a população enraivecida os culpava juntamente com o governo sírio que ocupava o Líbano, na época. Os protestos obrigaram os sírios a sair do país enquanto a Hezbollah quietamente preenchia o vazio deixado.
Um ano e meio depois, em 2006, a Hezbollah lançou um ataque a Israel. Seu objetivo era mostrar sua capacidade e arsenal com a desculpa de estar “defendendo” o Líbano. Defendendo do quê? Israel havia se retirado do Líbano em 2000 acabando com a razão de ser do grupo.
Para grupos jihadistas, sunitas ou xiitas como a Hezbollah, a “resistência” sempre toma a forma de agressão, terrorismo, limpeza étnica e a destruição de países inteiros. Em 2006, a guerra da Hezbollah contra Israel só levou à destruição do Líbano. Ainda assim, a Hezbollah encontrou uma maneira de ganhar mesmo após ter perdido.
Em 2008 ela mostrou que não estava brincando quando ocupou Beirute depois de confrontos com partidos políticos rivais, que não queriam que a Hezbollah tivesse uma rede independente de telecomunicações. Ela provavelmente usou a rede para planejar e levar a cabo o assassinato de Hariri.
Depois de 2008, a Hezbollah desviou investimentos estrangeiros, construindo uma economia paralela, lavando dinheiro do tráfico de drogas da América do Sul através de bancos corruptos ligados ao Irã.
Ela abraçou uma nova oportunidade em 2012 com a guerra civil da Síria enviando para lá milhares de soldados, e basicamente assumindo a política internacional e militar do Líbano. Aí a Hezbollah sequestrou o parlamento e a presidência do país recusando nomear um sucessor para o presidente cristão Michel Suleiman. Somente em 2016, o grupo conseguiu o que queria quando seu aliado, o corrupto Michel Aoun foi nomeado presidente.
Para a Hezbollah, a explosão desta semana pode se tornar mais uma oportunidade. Apesar de estar sendo criticado agora pela população o grupo irá encontrar uma maneira de se beneficiar também desta crise.
Logo após a explosão, Nasrallah veio à tona negando sua responsabilidade com ela e com o armazenamento de munições no porto. Mas nem três dias haviam se passado, na sexta-feira, Nasrallah decidiu atacar o norte de Israel em “resposta” à neutralização de quatro de seus soldados que tentaram plantar minas na fronteira. Sua mensagem foi clara: não quero saber do povo libanês. Se precisar começo outra guerra com Israel para manter meu poder.
O povo libanês está indignado. As pessoas tiveram que limpar suas próprias ruas porque os funcionários do governo desapareceram. Embora o presidente da França tenha ido ao Líbano no dia seguinte à explosão para oferecer ajuda, muitos políticos libaneses não saíram de casa. A única coisa que fizeram foi mandar deter funcionários portuários em suas casas, mas ninguém acredita em uma investigação séria.
Milhares se reuniram ontem à tarde com bandeiras libanesas para protestar. Gás lacrimogêneo foi derramado na multidão por horas. 142 ficaram feridos, e 32 foram levados para hospitais que já estão lotados com o desastre.
Os manifestantes enforcaram efígies não apenas do líder do Hezbollah, mas também do Presidente Michel Aoun e Nabih Berri, Presidente do Parlamento. Mas depois que esta onda de indignação acalmar e as pessoas se voltarem para sua sobrevivência, Nasrallah partirá para a ação. Ele irá insistir para que a China, a Rússia e o Irã reconstruam o Líbano. Ele enviará voluntários para ajudar e se mostrará como o único responsável no mar de irresponsabilidade. Ele tentará culpar Israel e os Estados Unidos pelas dificuldades do Líbano. Israel ficará constrangida em responder se atacada pela Hezbollah para não ser vista como prejudicando ainda mais o Líbano. Isto quer dizer que para a Hezbollah esta explosão se tornará a melhor cortina de fumaça e proteção para o grupo terrorista.
Enquanto a Hezbollah estiver fingindo ser patriótica, ela trabalhará incessantemente para corromper tudo que chegar ao Líbano nos próximos anos. Para os ansiosos doadores só resta entregar suas doações pessoalmente àqueles que necessitam e não confiar nesta corja que destruiu uma das cidades mais bonitas e diversas do mundo.
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